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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Por que as aves cantam?



Por que as aves cantam?
por Luis Navas Cubero

Juiz de canários de Porte e Híbridos.


Os naturalistas recusam a idéia de que as aves cantam por causa de seu bom estado de ânimo. Torna-se difícil conciliar uma interpretação excessivamente sentimental do canto das aves. Ao cantar, uma ave está consumindo tempo e energia, que poderiam servir-lhe para procurar alimentos, ao mesmo tempo em que revelam sua presença aos predadores.
As aves teriam deixado de cantar faz muito tempo se o valor de sobrevivência desta manifestação sonora não ultrapassasse os perigos que estão dentro de si.
O canto é tão só um dos elementos no vocabulário das aves. Além disso, cada espécie possui seus próprios gritos: mais de uma dúzia de sons diferentes em muitas espécies, cada um com seu significado próprio.

Às vezes torna-se difícil estabelecer limites precisos entre o canto e o chamado. Mas o canto está relacionado principalmente com a defesa de um território ou com a atração de um companheiro, enquanto o objetivo dos chamados consiste em transmitir outros tipos de informação como, por exemplo, avisar da aproximação de um predador. Os cantos tendem a ser uns complicados arranjos de notas, emitidas de um modo rítmico, na maioria das vezes pelo macho. Os chamados costumam consistir em estrofes curtas de até quatro ou cinco notas, menos agradáveis, pelo menos ao ouvido humano.
Uma ave é capaz de comunicar muitos dados com os sons que articula; pode indicar sua espécie, sexo, identidade individual e inclusive sua condição. Pode desencadear excitação sexual, curiosidade, alarme ou temor em outra ave. Por meio destes sons pode também atrair para um acasalamento ou afugentar um rival. Além disso, pode transmitir informações: onde se encontram alimentos ou onde há um lugar para aninhar.
Também pode avisar aos demais sobre a presença de um predador. Mas, quando canta, a mensagem habitual que a ave transmite é a proclamação de seu território.

Ao iniciar-se a época da criação, existem dois instintos que dão forma à vida de muitas aves: o de estabelecer um território e o de procurar parelha. O canto, em seu caráter de idioma que transmite informação de uma ave a outra, possibilita ambos objetivos.

A maioria das espécies canoras pode distinguir-se umas das outras por seu canto e, aliás, isto constitui uma função vital do mesmo. Enquanto o canto de uma ave revela o sexo a que pertence (geralmente trata-se de machos); só cantam as fêmeas de algumas espécies, como a do pisco-de-peito-ruivo, Erithacus rubecula, já que ambos os sexos mantêm territórios no inverno. O canto se interpreta de modo diferente segundo o sexo. Assim, o mesmo som entoado pelas fêmeas solitárias, refuta os machos intrusos. Mas o canto de uma ave proporciona detalhes ainda mais sutis; mediante variações imperceptíveis na tonalidade, ritmo ou repertório, pode expressar também a identidade individual da ave. Os cantos territoriais são avisos de longo alcance de uma ave a outra. Devem ser fortes e claros para ter eficácia e, logo depois, o suficientemente intensos como para que sejam escutados além dos limites do território.
Como regra geral, quanto menos atraente é a plumagem de uma ave, mais sonoro é seu canto. As aves que vivem e procriam em terrenos com vegetação espessa tendem a cantar com mais força do que as que habitam em zonas abertas. Tendo em conta o tamanho da ave, o canto do carriça, Troglodytes troglodytes resulta incrivelmente penetrante; mas o carriça, Troglodytes troglodytes, que costuma defender um território de um hectare, tem que se fazer ouvir em concorrência com muitas outras aves que vivem nos matas densas.

O canto também deve ser o suficientemente persistente como para ter eficácia, e a isto se deve que as aves repitam suas frases de canto centenas de vezes ao dia. A escrevedeira-amarela, Emberiza citrinella repete seu estribilho uma e outra vez, desde que começa o dia até que anoitece; quiçá tenha "dito" o mesmo mais de mil vezes.
Numerosas espécies elegem poleiros de canto nos lugares elevados das árvores, para assegurar-se de que seu canto abrange a zona mais ampla possível. Outras adicionam um efeito visual a seu anúncio descrevendo trajetórias características no ar. Os cantos em vôo são especialmente característicos das aves terrestres que chocam em terrenos abertos e sem árvores.

É muito raro que as aves rivais recorram ao combate físico, pois o risco de produzir-se verdadeiras lesões é demasiado grande para que represente um modo prático de solucionar um problema. Em lugar disso, desenvolveram uns modos de comportamento com os que obtêm resultados sem expor-se a muitos perigos. Seus cantos territoriais, tais quais suas complicadas exibições ameaçantes, constituem batalhas de nervos e cada ave desafoga a tensão acumulada por meio dos impulsos contraditórios: o impulso à luta e o impulso à fuga. Um pisco-de-peito-ruivo, Erithacus rubecula que se introduz em território alheio tenta fazer o menor ruído possível. Se o proprietário o vê, o mais provável é do que lhe cante com uma especial intensidade.
Costuma fugir imediatamente até seu próprio território; se não é assim, apóiam o canto com posturas agressivas. A seguir pode ter perseguição e, se tudo falha, as aves chegam à luta.

A ave que canta em defesa de seu território presta um cuidadoso atendimento aos cantos das outras que defendem os seus. O pisco-de-peito-ruivo, Erithacus rubecula, por exemplo, detém-se entre cada frase de seu canto, permitindo assim que seus rivais "disputem". Mediante os "duelos" de canto que mantém com seus vizinhos, o ave conhece quem são, onde se encontram seus rivais, se há alguma probabilidade de que lhe molestem ou se pode ignorá-los calmamente.
O canto das aves está intimamente unido à estação em que se emite e, apesar de que algumas delas possam cantar em qualquer época do ano, nunca vociferam tanto como na primavera, quando estabelecem seus territórios. Ao aproximar-se o verão e entregar-se ao acasalamento e a construção de seus ninhos, à postura, à incubação e à criação de seus filhotes, os cantos de muitas espécies se tornam mais intermitentes ou apagados e inclusive cessam do todo. O canto primaveril surge como resposta às modificações que os hormônios provocam no organismo da ave, particularmente o aumento de tamanho dos seus órgãos reprodutores, que se deve ao maior número de horas de luz. No inverno, a maioria das aves emudece e, em general, a chuva e o mau tempo tendem a inibir o canto.
No ciclo diário, tal qual no estacional, a luz é o fator principal que influi no canto. A passagem da noite para o dia produz o mesmo efeito no canto que a passagem do inverno para o verão. São mais aves que cantam durante 20-40 minutos na duração do amanhecer do que as que o fazem durante qualquer momento do dia. Não é fácil alegar uma razão biológica para isso, ainda que exista alguma vantagem em que todas as aves cantem ao mesmo tempo, já que dessa maneira cada uma se inteira do que está sucedendo a seu arredor e onde se encontram seus rivais.

São muito poucas as espécies que cantam continuamente durante o dia; a maioria se apazigua depois da exuberância inicial do amanhecer e se apagam para o meio dia. Aparece um ressurgimento do canto ao entardecer e quase todas as espécies emudecem ao cair da noite. A ave que canta pela noite costuma fazê-lo pela mesma razão que a que canta durante o dia; o chamado da coruja-comum é uma expressão de sua própria identidade e uma citação com seu casal. Mais difícil resulta estabelecer o porquê os rouxinóis cantam tanto de noite como de dia.
As aves também empregam o que poderíamos denominar "avisos e chamados". A maioria das aves vive em perigo constante de ser abatidas por seus predadores. Não pode surpreender, por tanto, que em sua linguagem inclua um sistema de alarme sumamente eficaz contra os predadores. A primeira ave que detecta um perigo em potencial faz soar o alarme que põe sobreaviso a todas que possam ouvi-la.
O perigo pode proceder do ar ou do solo e muitas aves adotam gritos de alarme que distinguem ambas as ameaças. Os alarmes que chamam o atendimento sobre os predadores aéreos costumam ser breves e agudos e constituem um tipo de som difícil de localizar. As aves que ouvem este alarme se dispersam e se escondem. Mas o chamado de alarme, para se opor ao predador terrestre, contém pistas referentes às localizações da ave que o tem detectado e a do predador. Apesar de que o canto de cada espécie tem que ser muito diferente para que não surjam confusões, seus gritos de alarme são freqüentemente muito parecidos. A ave que primeiro detecta uma ave de rapina avisa não só às aves de sua espécie, como também a todas as demais que possam ouvi-la.
As aves geralmente herdam de seus progenitores um vocabulário completo de cantos e notas de chamadas. A papa-amoras-comum, Sylvia communis não precisa nenhuma aprendizagem; ainda que leve toda sua vida sem ouvir cantar uma outra, segue desenvolvendo seus cantos e gritos e cada um seria perfeito em tom, volume, ritmo e qualidade. Isto se demonstrou com experimentos nos quais se criava estas aves num isolamento a prova de sons.
Outras aves possuem a mesma habilidade inata para interpretar os cantos característicos de sua espécie à perfeição, salvo em alguns detalhes. Nestes casos, a aprendizagem completa a tarefa começada pelo instinto. As aves jovens quando estabelecem um território pela primeira vez, seu canto geralmente costuma ser incompleto; mas cedo o remedeiam ao imitar a outros machos que cantam a seu arredor. A aprendizagem por imitação é um dos grandes mistérios do comportamento das aves. Muitas delas incorporam ao seu canto notas de outras e inclusive sons produzidos por objetos inanimados.



Tradução: Juan José Valdone
Fonte do texto
http://www.sitiodocurio.com.br/
Imagem do google

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